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17 de dez. de 2016

O FARDO DO FADO!

O fardo do fado!
Meu coração é nau portuguesa, que desbrava mares de incerteza, singra gigantes ondas, a caminhar pelo Porto e ver sua beleza.
Se a saudade me bate, apanho calada, a alma me lava.
Brinda-me com a ternura, rola-me pelo rosto, desgostos mil.
Se sofro, não me julgues, transformo-a em poesia.
Assim com o fado me morro todo dia.
Fado é destino, fatalidade, é música que canta o viver, 
é poema narrado em notas do sofrer.
Foi Deus que me pôs no peito, o que não só eu sinto, mas jogo ao vento.
Que não sei, nem ninguém sabe dizer.
De tormento e tristeza, que se acabam numa noite portuguesa.
Apego-me ao fado num socorro, que me foi negado.
Escoando essa dor desalmada, não incomodo a ninguém.
Adoço sim, corações além, renasço também.
Não há como correr, se triste ou não, como se há de saber…
Cujas almas sensíveis, presenteiam a escrever.
Gosto de descrever, o que tantos outros, insistem em esconder.
Como conseguir viver, sem amar alguém, sem ter ninguém.
"Eu te amo" a lhe dizer.


CARTAS DE UM BEIJA-FLOR. 1º CAPÍTULO.

O primeiro capítulo do meu livro.

Onde esse pequeno pássaro pensante, escreve o seu dia a dia observando os seres humanos.

Dotado de uma perfeição e rapidez incrível, “esse” nasceu inteligente no mundo dos homens!

O BURACO NA RUA!
Na rua Beija-flor moravam dois homens, vizinhos de casas coladas.
Saiam a mesma hora para trabalhar, voltavam no mesmo horário.
Dificilmente se olhavam ao sair ou entrar.
Eram dois soturnos, fechados em si mesmos, se entreolhavam discretamente, mas ninguém ousava falar.
Ambos acreditavam que o outro seria insensível ao cumprimento, pensando assim, passavam um pelo outro há dez anos, sem trocar um bom dia!
Tinham gostos parecidos em termos de carro, ambos possuíam o mesmo modelo e marca, apenas a cor se diferenciava.
Vander tinha o (prata) fosco e Faissal o (prata) brilhante perolado.
As coincidências eram muitas, não paravam por aí!
As maletas profissionais ambas Vitor Hugo, uma marrom e outra azul-marinho, mas as duas com as mesmas iniciais VH, motivo de olhares de desdém ao se verem usando o mesmo modelo.
Ao longo dos dez anos, inconscientemente ou não, ternos, sapatos, maletas, camisas, cores, preferências e até manias, eram compartilhadas mutuamente a contra gosto!
O que era motivo de escárnio, em contrapartida só confirmava o bom gosto de ambos se espelhando.
Se combinassem, não conseguiriam harmonizar tanto!
O silêncio imperava sempre!
As esposas eram amigas, trocavam conversas entre si, sem que eles soubessem do fato.
Ambas tinham ciência das rusgas omitidas.
Temiam que sua amizade acirrassem os ânimos.
Esperavam que Vander e Faissal saíssem para trabalhar, para colocar os assuntos em dia.
Trocavam informações e opiniões, chegando mesmo, uma a dar conselhos sobre o marido da outra.
Riam-se muito das manias estranhas deles.
Entre elas os chamavam de “Zéhorror” e “Zéterror”, já que eram chatos, prepotentes e arrogantes com todos.
Certo dia na rua do Beija Flor estourou uma manilha da rede de esgotos.
Claro que abriu um buraco grande e o mau cheiro invadia as casas.
Fato que deflagrou reclamações diárias por parte dos dois.
As mulheres coitadas é que sofriam, escutando todo tipo de grosseria.
Não havia argumento plausível que os fizesse parar de reclamar.
Vander acusa Faissal para a própria esposa, dizendo ser a família de Faissal, responsável pelo estouro do esgoto.
_Com certeza esse povinho deve jogar coisas estranhas no vaso sanitário, por isso entupiu tudo e compartilhamos agora o fedor deles.
Faissal por sua vez alegava que a família de Vander só dava miojo pros filhos e o resultado estourou a tubulação!
_Claro que isso entope tudo!
_Vou agora na casa desse povo, isso terá um fim!
Na saída de casa Faissal cheio de ódio, se dirige à casa ao lado desatento, tomado de ira pisa na sujeira tirada do esgoto.
A Terceira Guerra mundial foi deflagrada!
Vander escutando os berros, sai para verificar!
Os dois se olham, antecipando o juízo final.
Um pequeno beija-flor voa acelerado pelo local e dá um looping na cabeça dos dois turrões.
As mulheres só olhavam, sem acreditar que tinham se casado com aquelas toupeiras!
Os machões ao verem as esposas se entreolhando e fazendo caras e bocas, resolveram mostrar sua “virilidade oculta” sob as gravatas Hugo Boss!
Deram ao mesmo tempo uma porrada forte no pobre beija-flor, e erraram.
O pequeno voador foi mais rápido.
Ambos acertaram o nariz um do outro caindo na vala do esgoto!
As esposas entraram em casa, envergonhadas de seus homens!
O pessoal da prefeitura se afastou sem ajudar.
Um teve que dar a mão para ajudar o outro, senão ambos patinariam no miojo até agora.
A partir desse dia se cumprimentam mutuamente, já falam se vai chover ou não, e um elogia a gravata do outro.
O beija-flor escreveu sua primeira carta, falando dos homens!
_Maldade gratuita é dar tiro no próprio pé!
_Seres estranhos esses humanos, eu só queria uma flor perfumada para cheirar, o “miojo” estava insuportável!
Izabel Gonçalves.

CARTAS DE UM BEIJA-FLOR. 2º CAPÍTULO.

CARTAS DE UM BEIJA-FLOR.
Segundo Capítulo
O Canalha!
Nosso pequeno escritor, o beija-flor, voava tranquilo pelo bairro.
Quando viu uma janela aberta.
Chamou sua atenção o cheiro de flor, a fome bateu e voou em sua direção, crente que pelo menos um vaso de planta poderia haver no local.
Entrou afoito e viu um solitário homem, que digitava no computador, sem notar sua presença.
Cansado pousou na estante, para ver o que se passava.
O homem atento a tela, pulava de uma página para outra, esmiuçava imagens, as palavras de outras pessoas.
Respondia e perguntava, parecia falar com alguém.
Vez ou outra gargalhava, como se algo fosse engraçado.
O beija-flor ficou intrigado, pois, o homem se ria do que as mulheres escreviam.
Acabara de entrar numa página estranha, onde se passava por um galante paquerador.
Insinuava, escrevia coisas lindas, colocava imagens românticas.
O beija-flor lembrou da dança que alguns pássaros fazem antes do acasalamento, assim impressionavam as fêmeas.
Ficam posudos abaixando e subindo, abrem as asas, rodam, fazem mil piruetas.
Vez ou outra o homem soltava sons estranhos, como Huuuu! Ulalálálá! Hehehehehe!
Uma língua, que beija-flor desconhece.

O ser preparava a própria comida, engolia na frente da máquina, com olhos ávidos na tela.
O tempo passou e o beija-flor adormeceu.
Ao acordar o silêncio imperava.
Onde estaria aquele ser estranho?
Como o dia já raiava, nosso pequeno plumante saiu em busca de néctar.
Intrigado nosso escritor de cartas voltou no início da noite.
Sem ser percebido, se alojou no mesmo canto da estante.
A rotina era a mesma, o homem só levantava para buscar comida e bebida, ria muito do que as mulheres escreviam.
Vez ou outra comentava consigo mesmo o quanto eram chatas e pegajosas.

O beija-flor sentiu algo que lhe apertou o peito!
Mal conseguia respirar, o ar pesado, carregado de maldade, de sarcasmo, faziam mal ao pequeno tão sensível.
Cansado, adormeceu em silêncio, apenas os dedos nervosos na máquina emitiam sons.
O pequenino acordou, e se deu conta que mais uma vez tudo estava vazio, o homem sumira e a claridade do dia já entrava pela janela.
Pensou o bicudo.
_Vou voar pelos locais e procurar o estranho homem…
Decolou e entrou num lugar onde o ser humano fazia suas caquinhas, nada...
_Aqui ele saiu com comida, pensou...
Chamam a isso de cozinha, mas nada...
Enfim entrou onde ele dormia.
Espantado viu que o homem mesmo com o sol raiando, ainda não dormira.
Alojou-se no alto do armário, tentando escutar o que ele balbuciava.
Ria nervoso falando: “idiotas”.
Hora reclamava: “Elas merecem”.
_Farei todas sofrerem...
O pequeno colibri nada entendeu, apurou mais os ouvidos.
Por fim o homem ria e chorava, num misto de loucura e lucidez.
Convulsivamente dizia para si mesmo.
_Sempre sozinho... Sempre sozinho!
Odeio todas elas...
O beija-flor escreveu então sua segunda carta!
_Entrei num ninho que sempre está vazio.
_Sem fêmea, apenas um macho da espécie “canalha” enlouquecido por sua solidão.
Nosso lindo beija-flor nunca voltou ali.
Pesava-lhe o peito, arfava com tanta infelicidade.
Izabel Gonçalves.